sábado, 26 de março de 2011

HOMILIA DE DOM MURILO KRIGER DURANTE MISSA DE POSSE

Confira a homilia do novo arcebispo de Salvador e primaz do Brasil, Dom Murilo Kriger, na íntegra.


Posse de Dom Murilo S.R. Krieger, scj como Arcebispo de São Salvador da Bahia
Catedral, Solenidade da Anunciação do Senhor, 25.03.11

1.      Alegra-te, cheia de graça. O Senhor está contigo!” (Lc 1,30b-31). Tinha razão o anjo Gabriel, em pedir a Maria que se alegrasse. O anúncio que ele trazia à jovem de Nazaré era uma boa nova, uma alegre notícia: “Encontraste graça junto a Deus. Conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus” (Lc 1,28). Jesus: esse era o nome que o enviado por Deus dava ao filho que Maria era chamada a conceber, por obra do Espírito Santo. Além de chamá-lo de “Jesus”, o mensageiro de Deus o chamou também de Filho do Altíssimo (cf. 1,32).
2.      Dias depois da Anunciação do Senhor, Maria foi apressadamente à casa de sua prima Isabel. Da boca de sua parenta, o Filho que esperava recebeu outro nome: Senhor.  “Como mereço que a mãe do meu Senhor me venha visitar?” (Lc 1,43). Elogiada por Isabel, por haver acreditado no que lhe foi anunciado e proposto, a Mãe de Jesus prorrompeu num canto, conhecido com o nome de Magnificat (cf. 1,47-55). Nele, Maria engrandece seu Senhor e testemunha sua alegria em Deus, seu Salvador.
3.      Salvador. Até o momento da Anunciação, desconhecia-se que Deus é Trindade. Maria foi a primeira criatura a saber que Deus é Pai; e é Pai porque desde toda a eternidade tem um Filho, Jesus Cristo, “nascido do Pai antes de todos os séculos..., Deus verdadeiro de Deus verdadeiro” (Símbolo Niceno-constantinopolitano.). Foi também a primeira a saber que o Espírito Santo, terceira pessoa da Santíssima Trindade, é o “Senhor que dá a vida e procede do Pai e do Filho” (id.).  
4.      Por ocasião do nascimento de Jesus, o anúncio dos anjos aos pastores centrou-se em  uma certeza: “Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós o Salvador, que é o Cristo Senhor (Jo 2,11). Mais tarde, o mesmo título – Salvador – será dado a Jesus pelos conterrâneos da Samaritana: “Já não é por causa daquilo que contaste que cremos, pois nós mesmos ouvimos e sabemos que este é verdadeiramente o Salvador do mundo” (Jo 4,42). Em sua segunda Carta, o apóstolo Pedro incentivará as comunidades do norte da Ásia Menor: “Procurai crescer na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo” (2Pd 3,18).
5.      Salvador. São Salvador da Bahia. É com não pequena emoção que tomo posse como Arcebispo na cidade que, além de ser sede da primeira Diocese do Brasil, presta em seu nome uma homenagem a Jesus Cristo. Sim, o Filho de Deus é o nosso Salvador: “por nós foi crucificado..., padeceu e foi sepultado, ressuscitou ao terceiro dia...”.  
6.      Venho por nomeação feita pelo sucessor de Pedro. Procurarei exercer minha missão em profunda unidade com o Papa Bento XVI. Através de Sua Excelência, o Senhor Núncio Apostólico Dom Lorenzo Baldisseri, representante do Papa no Brasil, quero fazer chegar ao coração de Bento XVI a certeza de que me dedicarei com amor à missão que ele, Bispo de Roma, me confiou.
7.      Sucedo nesta sede episcopal ao Cardeal Dom Geraldo Majella Agnelo. Em sua pessoa, sempre me impressionaram a bondade e o senso de equilíbrio. Sua permanência em Salvador, após deixar o governo da Arquidiocese, assegura-me que terei, perto de mim, o apoio de um amigo e a ajuda de um colaborador eficaz.
8.      Presto minha homenagem aos nove bispos e 26 arcebispos que me antecederam. Todos eles foram decisivos na construção da bela história desta Arquidiocese. Nos passos que eles deram sou chamado a descobrir os passos de Deus, nesta terra abençoada. Na pessoa de dois deles, que conheci, reverencio a memória dos demais: o Cardeal Dom Avelar Brandão, de quem guardo a força da palavra e a bondade do coração; e Dom Lucas Moreira Neves, do qual recordo a unidade com o Papa João Paulo II e o amor à Igreja. Sei que esta Arquidiocese muito deve também a seus Bispos Auxiliares. Aos dois, que recentemente deixaram esta Arquidiocese para assumir governos diocesanos, Dom Josafá Menezes da Silva, Bispo de Barreiras, e Dom João Carlos Petrini, Bispo de Camaçari, asseguro minha prece e de minha amizade. A Dom Gregório Paixão, atual Bispo Auxiliar, dou minha certeza: contarei muito com sua colaboração no governo desta Arquidiocese Primaz.
9.      Trabalharei de perto com os Arcebispos e Bispos do Regional Nordeste 3 da CNBB, formado pelas 23 Dioceses dos Estados da Bahia e de Sergipe. Muito terei que aprender com vocês, meus irmãos, porque sei que muito vocês têm a me ensinar.
10.  Aos sacerdotes desta Arquidiocese, diocesanos e religiosos, quero testemunhar o que aprendi ao longo de meus vinte e seis anos de episcopado: a maior parte do que um Bispo consegue realizar em sua Diocese, consegue fazê-lo por meio de seus sacerdotes. Procurarei ser seu pai, seu irmão mais velho, seu amigo.
11.  Como pensar nos sacerdotes, sem pensar nos seminaristas? Porque vocês são a esperança da Igreja, são a minha esperança. “Amai a vossa vocação como o dom mais precioso que vos foi concedido” (João Paulo II, Catedral de Salvador, 06.07.80, dirigindo-se aos seminaristas).
12.  Ao dirigir-me aos Diáconos Permanentes, lembro que o ministério que vocês exercem é uma advertência a todos: seguir Jesus Cristo significa servir seus irmãos e irmãs, como aquele que lhes lava os pés.
13.  Sou religioso, da Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus. Devo muito à Congregação fundada pelo Pe. Dehon. Sei que uma congregação religiosa é um dom do Espírito Santo, para ressaltar na Igreja algum aspecto da infinita riqueza de Cristo. Confirmo-lhes, religiosos e religiosas, que a maior contribuição que poderão continuar prestando a esta Arquidiocese é a vivência profunda do próprio carisma. Vale o mesmo para os Institutos Seculares aqui presentes.
14.  Aos leigos e leigas, asseguro: vocês estão sempre presentes no ministério de um Bispo. Juntos, somos chamados a fazer de cada batizado um entusiasta discípulo missionário de Jesus Cristo. Nessa missão e responsabilidade, conto muito com as pastorais e os movimentos, as irmandades e as associações, as novas comunidades e outras organizações laicais.
15.  Ao me dirigir às Autoridades civis e militares, penso na afirmação do apóstolo Paulo: “Toda autoridade vem de Deus” (Rm 13,1). O serviço que prestam à sociedade os aproxima de mim, pois também sou chamado a servir a comunidade. Numa realidade tão desafiadora como a da Bahia, com imensas riquezas culturais e sérios desafios sociais, trabalhemos, pois, no devido respeito às responsabilidades de cada um, para, juntos, construirmos uma sociedade justa, fraterna e solidária. Agradeço a presença, nesta celebração ,não somente das Autoridades deste Estado que me acolhe, mas também as que vieram representar meu Estado natal, Santa Catarina.
16.  Há nesta Arquidiocese a presença de outras Igrejas cristãs. Respeitando nossas diferenças e aproximando-nos em vista do patrimônio imenso que nos une – por exemplo: a fé em Jesus Cristo Filho de Deus e Salvador, e na mesma Palavra de Deus –, estaremos buscando a unidade desejada por Jesus: “Pai..., que todos sejam um, para que o mundo creia” (Jo 17,21).
17.  Aos que são de religiões não-cristãs, lembro as palavras do Documento de Aparecida, que apresenta orientações para a Igreja que está na América Latina e no Caribe: somos chamados “ao encontro fraterno e respeitoso com os seguidores de religiões não cristãs e com todas as pessoas empenhadas no bem da justiça e na construção da fraternidade universal” (DA 168). 
18.  Muitos devem estar se perguntando: quem é este Bispo que vem de um Estado distante? O que pensa? O que nos traz? Limito-me a dizer-lhes que, catarinense da cidade de Brusque, muito devo à minha família; daí a profunda ligação que tenho com meus irmãos, cunhados e sobrinhos, com meus primos e primas. Posso-lhes dizer que experimentei em minha própria vida qual o valor da família. Muito devo, também, aos inúmeros amigos dos Estados em que trabalhei: São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Muito devo às Dioceses que estiveram sob minha responsabilidade: Ponta Grossa e Maringá, no Paraná, e Florianópolis, em Santa Catarina. Essa última me é particularmente cara por ser a minha Diocese de nascimento e onde, como Bispo, vivi por quinze anos.
19.  O que lhes trago? Meu lema episcopal sintetiza minhas convicções: “Deus é amor” (1Jo 4,16). Sei que essa certeza é vivida nesta Arquidiocese há 460 anos. Venho, pois, me unir a vocês nesta proclamação ao mundo: quem quer que você seja, qualquer que tenha sido sua história, há uma verdade que é mais forte do que qualquer outra: Deus o ama, porque é da sua essência amar, ser misericordioso e dar a paz. Nossa proclamação se faz tanto mais necessária diante da insegurança em que muitos vivem e dos imensos bolsões de pobreza que questionam as dimensões de nosso amor e de nossa criatividade. Além da proclamação do amor e da misericórdia de Deus, cabe-nos assumir como programa pastoral aquele que foi proposto pelo Papa João Paulo II, no início do novo milênio: a santidade. Santo é aquele que, imitando Jesus Cristo, caminha com ele, na força do Espírito Santo, ao encontro do Pai. A beatificação nesta Arquidiocese, pouco mais de três anos atrás, de Irmã Lindalva, e a beatificação, no próximo mês de maio, de Irmã Dulce, nos ensinam que os santos, porque tinham o olhar fixo em Deus e na eternidade, tinham os pés bem plantados na terra e, por isso, se debruçavam sobre os mais necessitados. Aliás, como dizia Dom Uribe, bispo colombiano: “Nenhum santo fracassou na pastoral”.
20.  Enfim, volto um olhar para o passado e um para o futuro. Para o passado: em sua primeira visita a Salvador, em 1980, o saudoso Papa João Paulo II afirmou: “Todo homem deve poder encontrar-se com Cristo... Todo homem, aliás, necessita de Cristo, também ele homem perfeito e salvador do homem. Cristo é a luz que, integrada nas mais diversas culturas, as ilumina e eleva por dentro” (07.07.80).
20.  Olho para o futuro e confio meu ministério episcopal, confio a Arquidiocese de São Salvador da Bahia ao Senhor do Bonfim, que da Colina Sagrada protege o bom povo da Bahia, e à Nossa Senhora da Conceição da Praia, à Mãe de Jesus, sempre disponível à vontade de Deus. Imitando-a, coloquemo-nos diante do SENHOR, e digamos-lhe: Somos teus filhos e filhas, ó Pai! Realiza em nós, e através de nós, a tua vontade! Para que assim, conduzidos por teu divino Filho, o Salvador, possamos participar um dia do Reino eterno. Amém.

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PARA REFLETIR...

Salmo 4

Quando te invoco, responde-me, ó Deus, meu defensor!
Na angústia tu me aliviaste: tem piedade de mim, ouve a minha prece!
Ó homens, até quando vocês ultrajarão minha honra, amando o nada e buscando a ilusão?
Saibam que Javé fez maravilhas por seu fiel: Javé ouve quando eu o invoco.
Tremam e não pequem. Reflitam no silêncio do leito.
Ofereçam sacrifícios justos e tenham confiança em Javé.
Muitos dizem: "Quem nos fará ver a felicidade?"
Javé, levanta sobre nós a tua face!
Puseste em meu coração mais alegria do que quando transbordam o trigo e o vinho deles.
Em paz me deito e logo adormeço, porque só tu, Javé, me fazes viver tranquilo.